A vigilância por IA e a propaganda enfrentam forte resistência

As iniciativas de controlo, da vigilância algorítmica aos anúncios em eletrodomésticos, provocam recuos.

Letícia Monteiro do Vale

O essencial

  • Uma agência federal de imigração fecha um contrato de 57 milhões de dólares para vigilância de redes sociais com ferramentas de IA.
  • Mais de um milhão de pessoas por semana recorrem a um chatbot para falar de suicídio, sinalizando lacunas de apoio humano.
  • Uma gigante do comércio eletrónico prepara demissões de 30.000 funcionários, as maiores da sua história, sob a bandeira de eficiência por IA.

Hoje, a comunidade r/technology expôs o fio comum entre vigilância estatal, litígios intimidatórios e um consumidor farto de “novidades” que só beneficiam quem cobra. O dia revelou um cansaço profundo com tecnologias orientadas para poder e propaganda, enquanto os utilizadores impõem um escrutínio feroz e, sobretudo, consequências.

Estado e empresas na guerra da narrativa

A tentativa de controlar o discurso apareceu em três frentes: a ofensiva jurídica no processo contra um criador que mostrou como abrir um cadeado de 130 dólares com uma simples técnica, a apropriação de estética de videojogo no uso de imagens de Halo por órgãos federais para “endurecer” a mensagem anti-imigração, e a expansão do olhar permanente no contrato de milhões para vigilância de redes sociais com ferramentas de IA. Em todos os casos, a mensagem de fundo é clara: mais controlo da narrativa, seja por via de tribunais, estética bélica ou rastreio algorítmico.

"1. Os cadeados da empresa são facilmente abertos. 2. A liderança da empresa é um bando de idiotas. Um duplo motivo para nunca comprar os cadeados deles." - u/TheTGB (7886 points)

O efeito boomerang é previsível: processos que parecem mordaça alimentam indignação, propaganda com ícones pop deprecia debates sérios e a vigilância em massa acelera a desconfiança dos cidadãos. Este tripé — intimidação, estetização e monitorização — mostra um poder que quer definir realidade e reação, mas encontra numa comunidade atenta um espelho implacável.

Do adware doméstico ao valor real: o consumidor impõe limites

O cansaço com o “tudo conectado” é palpável quando a publicidade chega à cozinha, com a invasão de anúncios num frigorífico de 2.000 dólares, e quando a ciência desmonta a hype, como no estudo que questiona ganhos visuais de 4K e 8K nas salas de estar típicas. A “novidade” tecnológica sem benefício tangível deixa de ser upgrade e passa a ser imposto.

"Eis como desativar. Tenho uma ideia melhor: simplesmente não compro." - u/Leody (3913 points)

Quando a indústria pressiona para extrair mais por menos, só reverte com gestos claros de valor: se a próxima consola acabar com a taxa para multijogador online, corrige anos de cobrança arbitrária por acesso que os utilizadores já pagam. E a migração silenciosa confirma a tendência: a subida das vendas de Mac com o fim do suporte ao Windows 10 mostra que as pessoas premiam estabilidade e controlo — não “assistentes” forçados nem métricas que ninguém pediu.

Dados expostos, ansiedade coletiva e o choque no emprego

Nem o Estado escapa aos seus próprios riscos: um vazamento de dados de candidatos com credenciais sensíveis no Congresso expõe como a segurança falha justo onde dizia ser inviolável. Ao mesmo tempo, a saúde mental já se cruza com algoritmos em escala, com mais de um milhão de pessoas por semana a procurar um chatbot para falar de suicídio, num sinal de carência de apoio humano e de novas responsabilidades para sistemas automatizados.

"Espera, 30.000, isso é real? Insano. Mesmo antes do Natal. E já falam em mais cortes no próximo ano se a IA puder fazer o trabalho. Isto são os Estados Unidos." - u/pm_me_blurry_cats (1105 points)

É neste pano de fundo que surgem as maiores demissões da história de uma gigante do comércio eletrónico, com o discurso da eficiência por IA a colidir com a precariedade de quem paga a conta. O desemprego em cascata à beira do fim de ano é combustível para frustração social, enquanto a promessa de “automação que liberta” soa, para muitos, como mais uma transferência de risco do topo para a base.

O jornalismo crítico desafia todas as narrativas. - Letícia Monteiro do Vale

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Fontes